Pedro Paulo: “A Lei das Cautelares introduz na legislação infraconstitucional direitos essenciais”

11/07/2011 Entrevista, Notícias

Está em vigor desde o dia 4 deste mês, a Lei das Cautelares (Lei 12.403), que altera o Código de Processo Penal para dar ao juiz a possibilidade de aplicar medidas cautelares alternativas à prisão preventiva. Para esclarecer o assunto, o Portal da OAB-GO entrevistou o advogado criminalista e professor de Processo Penal Pedro Paulo Guerra de Medeiros, conselheiro seccional e diretor-adjunto da Escola Superior de Advocacia de Goiás (ESA-GO) desde 2007. O entrevistado é especialista em Direito Penal, Processo Penal, Direitos Fundamentais e Política na Suprema Corte Norte-americana, Ciências Penais e Direito Penal Econômico e Europeu.

Quais são as principais novidades trazidas pela Lei das Cautelares que modificam o CPP?
Agora, há outros meios de se aplicarem medidas cautelares pessoais no processo penal, menos gravosas do que a prisão preventiva. Passou-se a utilizar o princípio da proporcionalidade. Passa o juiz a ter como opções de resguardo da eficácia do processo nove opções, sendo que antes somente existia a liberdade ou a prisão, dois extremos, em evidente sistema dualista. Agora, ele tem outras alternativas. Somente em caso de justificada ineficácia das medidas cautelares menos gravosas do que a prisão preventiva é que poderá o juiz se valer dessa extremada medida, que é a prisão preventiva.

Que avaliação o senhor faz a respeito da norma?
Assim como as demais leis que foram feitas desde 2008, e que modificaram sensivelmente o Código de Processo Penal brasileiro, essa lei pretende introduzir na legislação infraconstitucional direitos fundamentais já previstos na Constituição. Ela considera que a prisão cautelar não é um fim em si mesmo, uma vez que não se confunde com prisão penal (que é a aquela ocorrente quando alguém é condenado à pena de prisão, e essa transita em julgado), além de reconhecer a condição de falência do sistema penitenciário brasileiro, que não ressocializa seus usuários.

A Lei das Cautelares vai tornar o processo penal mais célere? Por quê?

Não vejo elementos, por hora, para afirmar que essa lei tornará o processo mais célere. Mesmo porque até hoje não se trouxe qualquer limite temporal para aplicação de medidas cautelares, o que seria um incentivo para que os processos tivessem rito preferencial. Fica, portanto, o prazo já estabelecido no CPP, mas que não sofrerá influência da nova redação trazida pela lei 12.403/11. Mesmo porque esses prazos são apenas indicativos, não havendo sanção pelo seu descumprimento. Prazo sem sanção não é prazo, é mera sugestão.

Ela pode contribuir com a melhoria do sistema prisional brasileiro? Como?
Certamente irá, pelo fato de não inserir, e nem permitir a permanência, no sistema de pessoas que desnecessariamente estariam, ou estão, lá. Assim, em tese, o sistema tende a progressivamente sentir redução no número de inseridos, o que levará à sensível melhora nas condições de tratamentos oferecidas aos usuários do sistema.

O senhor acredita que a norma pode provocar o aumento dos pequenos delitos?

Não acredito nisso. Temos, contudo, que ter certeza da punição ao infrator, punição essa que não necessita ser obrigatoriamente prisão. Investimentos em polícia, judiciário e Ministério Público devem ser realizados. O que traz efeito preventivo geral e específico é a certeza da punição, não necessariamente de que haverá prisão.

Por que na visão de alguns juristas a Lei das Cautelares reforça a presunção de inocência?
Porque somente em casos extremados de demonstrada necessidade, quando a liberdade do investigado/acusado colocar em risco a sociedade ou a eficácia do curso da persecução penal, é que poderá ele ser submetido a alguma medida cautelar. Não sendo essa hipótese, somente após uma eventual condenação, da qual não caibam mais recursos, é que se poderá obrigar alguém a cumprir uma medida restritiva de direito ou de liberdade, tal como expresso na Constituição. Evita-se, por exemplo, que uma pessoa a qual venha a ser reconhecida inocente, fique presa cautelarmente, antes da prolação desse reconhecimento de sua inocência.

Na sua opinião, há falhas na lei? O que precisaria ser alterado ou acrescentado?
Há lacunas, certamente. A lei não tratou dos prazos máximos para submissão às medidas cautelares, nem explicitou como se dará a detração, que é considerar o tempo em que a pessoa esteve submetida à medida cautelar para o fim de diminuição do tempo a ser cumprido em uma eventual condenação. E, finalmente, a nova lei traz previsão de que mesmo em casos de reconhecimento de prescrição a fiança não retornará ao afiançado, o que me parece inconstitucional, uma vez que a ocorrência da prescrição impede que a pessoa veja reconhecida sua inocência, porque o processo é extinto no estado em que se encontra. Não se pode, portanto, determinar a perda da fiança como se a pessoa fosse culpada.

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