Atuando no limite de suas atribuições e obrigações, a Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO) afastou um advogado e abriu processo ético contra outros três envolvidos na Operação Máfia das Falências.
A transparência, o dever de proteção a todo e qualquer advogado que seja vítima de acusações ineptas ou ilegais e a aplicação de sanções para todos aqueles que transgredirem as regras previstas no Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94) na relação com seus clientes guiaram a Seccional Goiana neste processo, iniciado no fim de 2019.
O presidente da OAB-GO, Lúcio Flávio de Paiva, ao comentar o caso, destacou que cabe à instituição definir seus procedimentos internos e que nenhum membro do Ministério Público deve questionar as medidas que a instituição, nos limites de suas atribuições e obrigações legais, adote ou deixe de adotar.
Em entrevista coletiva na tarde de ontem, os promotores de Justiça Juan Borges de Abreu e Rodney Silva questionaram a entidade de ter tomado medidas contra um advogado delator e por ter ingressado com HC em favor de outros três nesta operação, sem nenhum resguardo da lei para tal questionamento.
Lúcio Flávio ainda frisou que a OAB-GO respeita sobremaneira o princípio constitucional da presunção de inocência. “No caso do delator, ele foi suspenso porque, para ter o benefícios de leniência, confessou o conluio como cliente para perpetrar um crime contra a administração e Justiça. Essa leniência não atinge o processo disciplinar”, afirmou.
O presidente da OAB-GO afirma que o direito premial não interfere nos processos éticos-disciplinares. “São esferas distintas. Isso tem de ficar claro”, disse.
Caso
O procurador-geral da OAB-GO, José Carlos Issy, diz que, de acordo com a Procuradoria de Prerrogativas, as prisões preventivas dos três advogados foram decretadas a partir de provas colhidas de maneira ilegal e sem observar as prerrogativas profissionais, durante a Operação Máfia das Falências, deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público de Goiás.
“Desta forma, foi impetrado, no fim de 2019, HC em favor dos três advogados. A inclusão dos advogados na investigação, assim como na decisão que determinou o acautelamento preventivo, ocorreu, unicamente, pela formalização de acordo de colaboração premiada feito com outro advogado, no qual foi entregue uma gravação ambiental em uma reunião realizada com os demais investigados. Segundo o que consta nos autos da medida cautelar, a referida gravação teria conduzido o MP a conjecturar a participação dos requerentes no esquema criminoso”, destaca.
Este foi apenas um dos 30 HCs impetrados pela OAB-GO em favor de advogados no ano de 2019, visando a defesa de prerrogativas profissionais.
A Procuradoria de Prerrogativa da OAB entendeu que a gravação ambiental não poderia ser utilizada como prova lícita suficiente a justificar a deflagração de investigação criminal contra os advogados, tampouco para embasar futura e eventual ação penal.
“A gravação se amolda na acepção de prova ilegal, uma vez que foi produzida em reunião na qual o delator teria participado na qualidade de advogado do Grupo Borges Landeiro. Ou seja, em violação ao sigilo profissional”, conforme assinalam os Procuradores de Prerrogativas.
A Procuradoria ainda destaca que o advogado tem o dever ético de guardar o sigilo dos fatos e dos documentos de que tenha conhecimento em razão do exercício da profissão, sendo que a violação do sigilo, sem justa causa, caracteriza infração disciplinar. E, em certos casos, crime contra a inviolabilidade do segredo.
“A disponibilização da gravação ambiental, em sede de colaboração premiada, resultou a um só tempo em quebra do dever de sigilo profissional, assim como na incriminação de diversos agentes, incluindo os advogados requerentes, sem que houvesse a justa causa para exposição das conversas.”
Processo ético
O presidente do Tribunal de Ética da OAB-GO, Samuel Balduíno, afirma que, com relação ao advogado delator, sua suspensão preventiva decorreu de representação formal formulada por seu ex-constituinte, Construtora Borges Landeiro, antes mesmo da deflagração da Operação, em razão da violação do sigilo profissional, o que, de plano, já configura falta ética reprovável. Para além disso, verificou-se que o advogado prestou concurso ao cliente com intenção de fraudar a lei, o que também configura falta ética gravíssima e justifica a medida de prevenção. O advogado foi devidamente notificado em seu endereço de cadastrado e não apresentou defesa. Ainda assim, a ele foi nomeado defensor dativo que promoveu sua defesa e acompanhou todo o processo. Tudo isso em obediência ao que determina a Lei 8.906/94.
“Ainda, diante de toda situação mostrada, foi instaurado procedimento para apurar, igualmente, a conduta dos advogados e tomadas as providências pelo Tribunal de Ética e Disciplina (TED). Solicitamos à juíza de Direito da 6ª Vara Criminal da Comarca de Goiânia, Placidina Pires, no dia 6 de dezembro de 2019, o encaminhamento de cópia integral (digitalizada) do processo judicial, a fim de instruir o feito. E apesar de não termos recebido resposta até a data de hoje (dia 28 de fevereiro de 2020), o processo ético segue sua tramitação regular.”