O artigo “O que está acontecendo com o PLC 122?”, de autoria da presidente da Comissão de Direito Homoafetivo da OAB-GO, Chyntia Barcellos, foi publicado no jornal digital A Redação, na quinta-feira (8).
A polêmica em torno do Projeto de Lei da Câmara 122 tem sido uma constante no cenário legislativo brasileiro. Em suma, o que se sabe é que a bancada religiosa e da família no Congresso Nacional se opõe a qualquer tipo de lei que reconheça e regulamente direitos da população de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT).
O exercício pleno da cidadania no Brasil esbarra em um sistema legal complexo e burocrático, onde seus cidadãos pouco ou quase nada sabem sobre qual é o caminho que um projeto segue até virar uma lei. No que tange ao PLC 122/2006, as dúvidas e rejeições são diretamente proporcionais ao crescimento do preconceito e da intolerância.
A senadora Marta Suplicy (PT-SP) vem protagonizando a retirada desse projeto da invisibilidade. Após as eleições de 2010, a ilustre parlamentar se empenhou em desarquivá-lo e iniciou um diálogo com as forças contrárias dentro do Congresso Nacional, com o intuito de conseguir sua aprovação.
O substitutivo apresentado, ou seja, o novo texto, não se trata de outro projeto, mas altera substancialmente o primeiro e desta vez vem recebendo críticas inclusive vindas do movimento social LGBT, haja vista que o próprio deputado Jean Wyllys (PSol-RJ), da Frente Parlamentar Mista pela Cidadania LGBT não participou e não foi chamado para a formalização desses recentes arranjos.
No afã de se aprovar “qualquer lei” que criminalize basicamente a homofobia, ou melhor, a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero, o projeto perdeu sua essência com vias a contribuir e perpetuar o preconceito. O novo texto suprimiu a alteração da Lei 7.716/89, a Lei do Racismo, que define como crime tratamentos prejudiciais por raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.
Outra crítica contundente se refere ao acréscimo no substitutivo de dispositivo reforçando a liberdade de expressão religiosa, já prevista constitucionalmente pelo artigo 5º, inciso IV, da Carta Magna. Esse é o ponto crítico do projeto. Fundamentalistas religiosos chegaram a nominá-lo de “lei da mordaça”.
Sobretudo, segundo o magistrado Roger Raupp Rios, “não se trata de cerceamento das liberdades de opinião ou de religião. Assim como na proibição do racismo, o que se quer evitar é que a injúria e a agressão, fomentadoras do ódio e da violência, campeiem sem restrições, pondo em risco e ofendendo a vida e a dignidade.”
Diante do mundo plural que paira sobre todos nós, liberdade de expressão e de culto religioso não se comunga com violência e incitação ao ódio, esse princípio não é absoluto, encontra barreiras junto aos princípios da dignidade da pessoa humana, da vedação ao preconceito, da igualdade, da liberdade, da inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem dos indivíduos, do direito de resposta, da laicidade do Estado, dentre outros.
Neste contexto, a retirada da homofobia da lei geral antidiscriminatória aqui referida, relega milhares de pessoas à segunda categoria, o que é constitucionalmente proibido, assim como foi explicitado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), ao reconhecer a união entre parceiros do mesmo sexo como uma entidade familiar.
Na data de hoje, o PLC 122/2006 seria analisado pela Comissão de Direitos Humanos do Senado. Antes que se iniciasse a votação, a senadora Marta Suplicy retirou o projeto da pauta para reexame e novo diálogo com os seus opositores.
Em meio a tantos desgastes, talvez seja a hora de arquivar o PLC 122/2006 e unir esforços para que a Proposta de Emenda Constitucional 111/2011, também de autoria da senadora, que visa, em vez de criar uma lei ordinária, alterar o artigo 3º da Constituição Federal, para incluir entre os objetivos fundamentais do Brasil a promoção do bem de todos, sem preconceitos relativos à identidade de gênero ou orientação sexual.
A PEC 111/2011 foi idealizada e construída pela Ordem dos Advogados do Brasil, por meio da Comissão Especial da Diversidade Sexual, que, dentre as suas principais funções, está a missão de buscar a edição de leis que garantam a cidadania plena de milhares de pessoas LGBT.