Discurso proferido pelo presidente do Idag nesta quarta

04/06/2008 Antiga, Notícias

 


O discurso abaixo foi proferido pelo presidente do Instituto de Direito Administrativo de Goiás (Idag), Fabrício Motta, na abertura do VII Congresso Goiano de Direito Adminstrativo, realizada na manhã desta quarta-feira (4).


 


Senhoras e Senhores,


O Instituto de Direito Administrativo de Goiás – IDAG, entidade científica, de utilidade pública e sem finalidades lucrativas, tem o prazer de hoje dar início ao VII Congresso Goiano de Direito Administrativo. Pelo sétimo ano consecutivo, este importante evento jurídico – o mais conceituado de nosso Estado – é realizado com o intuito de alcançar conclusões – e propor novas indagações – a respeito de temas atuais e polêmicos ligados à Administração Pública.


Datas, assim como as estrelas, sempre fascinaram o homem. Datas inspiraram estudos, poesias, previsões, determinaram guerras e, para alguns, traçaram destinos. Estrelas, por sua vez, orientam e encantam o homem desde seu surgimento. Já direcionaram o curso das plantações, determinaram o crescimento de sociedades, inspiraram sábios e continuam a inspirar amantes e poetas.


Se me permitirem o devaneio, abrirei este Encontro falando brevemente sobre datas e estrelas. Quis o destino – e o destino possui suas próprias regras, disse o filósofo – que comemorássemos em um mesmo ano o aniversário da Constituição da República e o aniversário da fundação do nosso IDAG.


“A coragem conduz às estrelas, e o medo conduz à morte”, disse Sêneca, e é com a marca da coragem que essas datas, hoje, podem ser comemoradas.


Há 20 anos, em uma época em que se via nos muros, segundo alguns, a frase “chega de realidade: queremos promessas”, foi proclamada nossa Constituição Cidadã. A Carta marcou o início de um novo tempo, alvissareiro, em que a escuridão de antes era ofuscada pela promessa de luz; de um país mais justo, solidário, em que o ser humano se realizasse em sua plenitude.


“No fundo de um buraco ou de um poço, acontece descobrir-se as estrelas”, disse Aristóteles. O texto de fundação da nova ordem jurídica foi e é, em sua essência, reluzente e primoroso: resultado de muitos debates, consagrou direitos e liberdades; concedeu garantias, enunciou princípios. Foi consolidado o sufrágio, a democracia formal; reforçaram-se os direitos de defesa do cidadão frente ao Estado.


A Administração Pública, antes relegada a plano inferior, assume importância fundamental, sendo guiada por princípios e valores que apontam, indiscutivelmente, na direção da supremacia axiológica do interesse público. Foram imaginados diversos instrumentos de participação e controle, para que o cidadão consciente pudesse, ao mesmo tempo, fazer parte e fiscalizar toda atuação do Estado, premissa fundamental da democracia material. Foram protegidos bens jurídicos de suma importância, como o meio ambiente, a família e o ensino, como patrimônio de toda a sociedade cujo zelo e realização incumbe, primeiramente, ao Estado.


Nossa Constituição vintenária, formalmente, é superlativa. Contudo, como disse o saudoso Paulo Neves de Carvalho,


“a lei escrita e estrita não cria, nem sustenta, tecido moral e ético; a compreensão moral reside na consciência individual e social; iniludivelmente esse  tecido moral, somente ele, pode vir em socorro da lei, escoimando-a de sua freqüentes imperfeições e, agora, como expressão de direito, comunicando-lhe capacidade de gerar os frutos sociais que o novo tempo consagrou, no plano teórico”.


Muitos óbices estão entre o ideal teórico e sua concretização, entre os valores formalmente consagrados e sua passagem para o duro mundo da realidade, protagonizado solitariamente pelo ser humano. Entre esses óbices, destaca-se a falta de desenvolvimento econômico, sem o qual não se instala a promoção social; em decorrência, a profunda exclusão social, que aparta do processo de assimilação de valores toda uma legião de milhões de compatriotas, condenados à doença, ao desemprego, ao medo, à fome e à ignorância.


Sem ação efetiva e decidida do Estado não se supera a condição de agente excluído; sem inclusão não há consciência, sem consciência não há cidadania e, tampouco, democracia.


A concretização das promessas da Constituição é dever do Estado e, por conseqüência, de seus governantes. Disse o poeta que “Enquanto se pensa, muitas vezes a ocasião se perde”  (Públio Sírio); não é hora de pensar nem de prometer, como há 20 anos, mas de efetivar – de mirar a Constituição não como se mira as estrelas, mas como um horizonte próximo, de possível alcance, de caminho necessário. Já não queremos promessas, mas ações.


Como escreveu Fernando Pessoa,


“Há um tempo em que é preciso
abandonar as roupas usadas
Que já tem a forma do nosso corpo
E esquecer os nossos caminhos que
nos levam sempre aos mesmos lugares
É o tempo da travessia
E se não ousarmos fazê-la
Teremos ficado para sempre
À margem de nós mesmos”


 


Dez anos após a promulgação da Constituição, em 1998, foi fundado o IDAG com o intuito de cobrar, em nosso Estado, o abandono definitivo dessas roupas usadas. Fruto da mente sonhadora de Nélson Figueiredo – típica dos poetas – o Instituto visava trazer para nosso Estado os maiores juristas para discutir os grandes temas que atormentavam os estudiosos locais e, assim, contribuir para a evolução e difusão do estudo da disciplina em Goiás.


Nesses 10 anos de existência, foram muitas as realizações, sempre permeadas por uma premissa fundamental: a de que administrar é servir o público, e não servir-se dele.


Em seu aniversário, arrisco dizer, mirando com satisfação esse auditório tomado, que o IDAG continua conseguindo sucesso em suas empreitadas e também continua fiel às suas origens.


Continuamos acreditando que todo poder é instrumental e somente pode ser utilizado em prol do interesse público;        Continuamos pregando que a Administração Pública não possui proprietário, na lição de Cirne Lima, e que por isso deve ser exercida de forma impessoal, independente de amizades, nomes e sobrenomes;        seguimos firmes na crença de que valorizar o servidor público é valorizar o serviço por ele prestado e, com isso, valorizar o cidadão, destinatário supremo de toda ação estatal.


Não precisamos de agentes públicos marejados, mas sim de decididos. Não precisamos de conformados e acomodados, mas de caminhantes e corajosos.  Não precisamos de qualquer disputa de vaidade, pois o protagonista já está definido: trata-se do cidadão, com todas suas angústias, incertezas e, sobretudo, esperanças.


Para a construção de uma Administração Pública democrática, consensual, respeitadora, razoável e que ampare transformações sociais, não bastam simplesmente normas. Temos muitas, mas boas normas – ainda que algumas necessitem de mudanças, antes de tudo é preciso cumprí-las e fiscalizar o seu cumprimento, valorizando o papel do intérprete que deve buscar esse desiderato mirando na efetividade de nossa Constituição, seus princípios e valores.


De nada adiantarão sucessivas leis, decretos e reformas, se a Constituição não for respeitada; de nada adiantarão quaisquer medidas, ainda que ocas, se não contarmos com agentes públicos probos, éticos, corajosos e ativos, dispostos a trabalhar e a assumir responsabilidades.


Esse o papel do estudioso do Direito Administrativo e do agente público. Consciente desse papel, o IDAG hoje inicia mais um Congresso, com a missão de despertar nosso público para a importância da força normativa da Constituição e para a cobrança de suas promessas. Esta importante realização certamente não seria possível sem os apoios conquistados. Tenho imenso prazer em agradecer:


– Aos congressistas, ávidos por conhecimento e participação, que sempre nos prestigiam, razão de ser do evento;


– Aos professores de outros estados e aos professores goianos, que, confiantes na reputação do IDAG, gentilmente atenderam ao nosso convite;


– Aos nossos patrocinadores e à Diretoria do IDAG


– Aos órgãos e entidades que incentivaram a participação de seus servidores e ajudaram na divulgação do evento. 


Senhoras e Senhores,


Na poesia de Drummond, o mineiro de Itabira


Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o meu futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles,considero a enorme realidade.
O presente é tão grande,não nos afastemos.
Não nos afastemos muito,vamos de mãos dadas.


 


A efetividade e o respeito à Constituição dependem do compromisso de cada um; o sentimento constitucional deve ser chama em cada um de nós. Nosso chão é verde e seguro, talvez até exuberante; em nosso céu risonho e límpido, a imagem do cruzeiro resplandece. As perspectivas que se desenham no horizonte, reluzentes, reforçam nossas esperanças e reiteram a importância de nosso labor, de nosso compromisso, de nossa consciência, de nossa cobrança.


Muito obrigado, sinceramente, pelo prestígio e pela confiança nesses 10 anos. Com essas palavras, sob a proteção de Deus, declaro aberto o VII Congresso Goiano de Direito Administrativo, desejando um ótimo proveito a todos. Muito obrigado.

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