Diminuição da quantidade de demandas através da fixação de honorários advocatícios de sucumbência

03/11/2010 Artigo, Notícias

O artigo “Diminuição da quantidade de demandas através da fixação de honorários advocatícios de sucumbência” é de autoria do advogado e professor Marco Túlio Elias Alves, membro da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB-GO.

Nos últimos anos, a mídia ganhou espaço imensurável em todas as suas formas de comunicação, e, com isso, de certo modo, no seu papel de informar criou cidadãos muito mais conscientes de seus direitos e deveres, fazendo-os buscar, mais que nunca, a satisfação de seus interesses diante do Poder Judiciário. Essa busca, numa escala exponencial e crescente, constitui-se num verdadeiro “boom” judicial, abarrotando as prateleiras das serventias e mesas dos juízes, que não conseguem entregar a prestação jurisdicional de forma rápida, eficiente e dentro do que se chama “prazo razoável de duração do processo”.

Segundo estudo recente, uma comarca como a de Goiânia deveria ter, no mínimo, cento e dez juízes, além dos que temos. Isso representaria um impacto mensal de aproximadamente um milhão de reais aos cofres do Estado, sem contar gastos com estrutura. Assim, alternativas para reduzir a atuação dos magistrados são condições que garantem qualidade na prestação jurisdicional, até mesmo porque a maioria dos juízes é impelida a acumular funções, passando também a ter responsabilidade com a gestão do cartório e de pessoas, o que reduz significativamente suas condições e tempo para julgamento de ações.

Uma alternativa de sucesso em Goiás tem sido as câmaras de conciliação e arbitragem, que, hoje, segundo dados divulgados pelo próprio Tribunal de Justiça, são responsáveis pelo desfecho de 20% (vinte por cento) dos processos no estado, servindo de exemplo inclusive para outros países. Isso nos coloca a pensar no papel da conciliação como forma de redução de demandas e o consequente desafogamento do Poder Judiciário, permitindo aos magistrados melhor qualidade em processos que exigem solução litigiosa.

O avanço das relações humanas nos últimos séculos vem exigindo cada vez mais empenho dos profissionais que lidam diariamente com os problemas sociais, impulsionando, de certa forma, a melhoria dos serviços prestados à população. Os clientes de escritórios de advocacia, em plena maioria, não mais buscam alternativas impensáveis para protelar os feitos judiciais, preferindo , isto sim, a busca de meios para conciliar seus interesses com rápido desfecho de suas demandas.

Entretanto, não existem no Brasil elementos práticos e eficientes para estimular a conciliação. Alguns projetos isolados de iniciativa do CNJ, que vem sendo colocados em prática pelos Tribunais, colaboraram para o aumento das composições, mas representa um número ainda insignificante, quando comparado a outros países onde a prática do “acordo” é mais bem difundida. Para se ter uma ideia, nos Estados Unidos o índice de conciliações chega a mais de 70% (setenta por cento) dos casos. No Brasil, não se chega nem a 27% (vinte e sete por cento), mesmo depois de várias campanhas.

A diferença gritante entre o sistema de julgamento norte americano e o brasileiro é basicamente a forma de se determinar os encargos da sucumbência. Nos Estados Unidos, além de custas de valor elevado, pagas somente no final pelo perdedor (sem nenhuma antecipação pelo autor), a condenação de sucumbência inclui multas elevadas e honorários advocatícios de 33% (trinta e três por cento) do proveito econômico da causa. Ao todo, em alguns casos, o montante da condenação pode até dobrar.

Os advogados que estimulam seus clientes à conciliação como forma de por fim a demandas judiciais, quase sempre ouvem deles a seguinte pergunta: “Quais as consequências de se recusar essa composição?”. A resposta geralmente não é muito intimidadora, já que as verbas de sucumbência não são capazes de remunerar o uso do capital durante mais algum tempo de tramitação do processo. Explico na prática:

O defensor dativo nomeado ao réu, nos autos da ação de nº 200500850415, que tramita na 2ª Vara Cível de Aparecida de Goiânia, envolvendo a discussão acerca de uma promessa de compra e venda de um apartamento, com valor de mercado, à época, de mais de 65 mil reais, conseguiu, após a prática de todos os atos inerentes à defesa, a extinção do processo sem análise do mérito.

O valor dos honorários de sucumbência foi fixado na quantia de 500 reais, que depois de um recurso adesivo foi majorado para 1.500 reais, o que corresponde a pouco mais de 2,3% (dois virgula três por cento) do proveito econômico da parte. Outro elemento para se analisar, é que a solução do conflito está pendente há pelo menos cinco anos, e mesmo já sentenciado, ainda não teve um desfecho real com a satisfação do interesse das partes.

A quantia de 65 mil reais, aplicada miseravelmente a 0,5% (meio por cento) ao mês, a juros simples, renderia quase 20 mil reais em cinco anos. Após o pagamento das custas processuais e honorários de 1.500 reais, o “protelador” auferiria um lucro de 18 mil reais…

Destarte, não é preciso ser gênio para se chegar à conclusão de que o sistema de fixação da sucumbência com valores ínfimos tem ligação direta com a grande quantidade de processos pendentes de julgamento, já que não estimula a conciliação. Vejamos o exemplo das Cortes de Conciliação e Arbitragem de Goiás: mais de 95% (noventa e cinco por cento) dos casos terminam em conciliação. Observe  a penalidade ao perdedor, que, além dos honorários de sucumbência, fixados quase sempre em 20% (vinte por cento) do valor da causa, tem que arcar também com as custas processuais e mais os honorários arbitrais, estipulados, segundo critério das cortes, em mais 10% (dez por cento). O total de despesas, dependendo do caso, pode chegar a 40% (quarenta por cento) do valor original da causa, bem menor que os quase 100% (cem por cento) praticados nos Estados Unidos, mas com resultados positivos para a conciliação.

E mesmo em outras circunstâncias, as próprias regras de fixação de honorários de sucumbência no processo civil já garantiriam, em quase totalidade de casos, a fixação de honorários maiores. Os critérios, segundo as regras constantes nos parágrafos do art. 20 do CPC, impõem ao juiz valorar: a) o grau de zelo profissional – ora, se a parte alcançou o objetivo com a demanda, então deve-se presumir que houve zelo satisfatório; b) lugar da prestação do serviço: considerar se é comarca distante do domicílio do advogado, e também as dificuldades de acesso e estacionamento que os profissionais enfrentam, mesmo que seja na própria comarca; afinal, se o profissional custeia despesas com guarda de seu automóvel e combustível, desgastes, etc, para patrocinar os interesses do seu cliente, deveria, com certeza, ter o valor de seus honorários majorado; c)  importância da causa: considerando a complexidade e dificuldade do trabalho, lembrando principalmente que esse item é de caráter a ser julgado pela própria parte, e que se busca o Poder Judiciário, popularmente conhecido por “demorado”, e, mesmo assim, aceita se submeter ao rito processual, deve-se acreditar que é algo realmente importante ao vencedor da demanda.

Mas a regra processual exigiria folhas a mais de estudo, e não é o objetivo deste trabalho. Assim, voltamos ao foco, que é a utilização das ferramentas de sucumbência para estimular composições de interesses.

Dessa forma, a fixação de honorários de sucumbência é recurso extremamente útil ao magistrado, para reduzir a quantidade de processos – o que, por consequência, tornaria os procedimentos judiciais mais céleres, concorrendo tudo para a melhoria dos serviços forenses e da prestação jurisdicional. Práticas para facilitar a execução desses honorários também encontram espaço na presente sistemática, efetivando a medida. Essa ferramenta, a médio e longo prazo, certamente irá contribuir, de forma precisa, com as iniciativas de composição, para aqueles que objetivam “escapar” dos pesados encargos da sucumbência, se assim os juízes os praticarem.

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